Ivani Medina
Os melhores brinquedos e brincadeiras que vêm a lembança eram os inventados por nós, crianças. Quando não, tomávamos emprestado da memória das crianças de outrora, que havia em todas as casas. Nada contra o desenvolvimento da indústria de brinquedos, pelo contrário, novidades sempre foram bem-vindas.
A vida social infantil era mais intensa. Vivia-se mais na rua do que em casa, como atualmente. Uma existência informal extramuros ajudava muito o desenvolvimento e a criatividade no mundo próprio. Sempre havia um que era mais engenhoso e habilidoso e contava com a admiração e o relativo respeito dos demais. Afinal, era o responsável por inúmeras satisfações e alegrias de todos.
Um desses gênios era o “bigode de vaca”. Ganhou o apelido porque já exibia um buço bem desenvolvido para a pouca idade que tinha. “Bigode” era óbvio, “de vaca” nem tanto. Apelido precisa ser engraço e ter raízes em alguma maldade. Os mais safados diziam que era porque a cada dia ele se parecia mais com a mãe. Claro que não abertamente, pois não havia necessidade de ferir tão profundamente um amigo.
Pedíamos nas oficinas mecânicas rolamentos já sem serventia para automóveis, mas perfeitos para a nossa utilização. O italiano sempre nos fornecia alguns. Guardava-os numa lata de thiner cortada ao meio e sabíamos muito bem onde ele a deixava. Na sua ausência, podíamos informar ao funcionário e resolver o nosso problema sem perda de tempo.
Algumas tábuas de caixotes conseguidas no comércio e dobradiças de portão constituiam o corpo do patinete mais simples. Mas quem queria saber de simplicidade? Tinham pintura personalizada e um bom freio na roda trazeira. O do “Bigode” tinha até farol. Como era bom se divertir com o produto das próprias mãos e imaginação.
O máximo era descer pelas calçadas das ruas íngrimes, em quatro ou cinco, fazendo aquela zoeira ameaçadora aos passantes. Naqueles momentos todas as atenções se voltavam a nós. Os reis das calçadas, nós nos imaginávamos. Sabíamos que sempre havia alguém torcendo por um tombo espatacular e com muita choradeira, só por vingança. Tombo que nunca acontecia ou acidentes quaisquer com os azes das calçadas que éramos.
A pouca velocidade crescia na imaginação com o vento rosto. Tirar fino dos canteiros e as manobras ousadas preenchiam sentimentos desconhecidos. Riscando o cimento das calçadas traçavamos as primeiras linhas da nossa independência e vontade.
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Ivani de Araujo Medina é um Homem com a percepção do descompasso existente entre a história e o favorecimento ideológico ao cristianismo.
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