É o abrir-se e o deixar-se atingir pela dimensão originária do Deus-mistério, entendido como a intimidade mais profunda de nós mesmos. É a questão mais fundamental do homem, questão universal, questão antiga sempre de novo colocada. A “ciência do espírito” saboreia, experimenta que a aventura do espírito pode acontecer em três níveis diferentes, sempre entrelaçados.
O primeiro nível é o estético, norteado pela busca do prazer. A palavra “estético” vem do grego “haystesis”, que significa sensibilidade à flor da pele.
É um existir que se origina da própria pessoa, do seu interesse utilitarista. Nesse nível prevalece a espontaneidade, o gosto, a vibração; vive-se ao sabor da sensação, da emoção. Este modo de viver pode se tornar uma escravidão. Pois tudo pode ser vivido esteticamente; isso acontecendo, a vida fica sem profundidade e não alcança maturidade.
Uma certa corrente da espiritualidade moderna valoriza muito o estético; é porém de perguntar se esta é uma espiritualidade verdadeiramente adequada ao fenomeno do espírito. O segundo nível é o ético, norteado pela busca do dever. A palavra ético vem do grego “ethos”, que significa morada, por isso esse nível de espiritualidade exige treino, disciplina, educação para “morar” na terra dos homens.
Todo esforço humano para estabelecer-se, cultivar, construir, projetar, criticar, debater, trocar ideias, fazer política pertence a este nível de viver. Nele o que determina a vida não é o gosto da pessoa ou seu interesse, mas a identidade, o sentido da vida buscado. O homem ético está todo voltado ao dever e, na experiência do dever, cresce em liberdade. Há, ainda, um terceiro nível, o religioso.
Os exercícios do viver ético levam, aos poucos, ao umbral da experiência religiosa: depois de ter saboreado o gosto do dever, fazendo tudo o que devia fazer, tem-se a percepção de que a identidade humana é mais do que isso. A vida, a partir do rigor, da renúncia, da dureza do exercício ético, abre-se para a fé; abre-se para uma luz que está além da nossa possibilidade: a jovialidade da presença do Deus-mistério e a percepção de que somos seus filhos.
A existência religiosa é a resposta mais radical à questão da busca do sentido da vida. A “ciência do espírito” experimenta que, na dimensão do espírito, nenhum vigor acontece espontânea e automaticamente. A busca do sentido da vida não é nenhuma coisa já feita, existente em si; é sempre tarefa, desafio! Tarefa essencial que dura a vida inteira. A busca do sentido da vida, a aventura do espírito, portanto, deve ser aprendida, trabalhada, formada.
O espírito, entendido como “o cerne do humano”, é dom de conquista. Conquista porque requer a doação engajada e total da liberdade da pessoa na situação concreta como condição para o emergir do sentido da vida. Dom porque não depende da dominação e do poder do nosso querer e saber; ele advém graciosamente.
Na vida cristã, a formação do espírito, a espiritualidade, como caminho de busca do cerne do viver humano, não é outra coisa senão o discipulado do seguimento de Jesus Cristo, recebido como dom e colocado como sentido e conquista da vida que, por isso, se chama cristã.
A esse processo chamamos de “encontro” com Jesus Cristo; nele o primeiro passo é já o próprio acontecer do encontro. É esse contato imediato que vai temperando, forjando o nosso ser, de tal sorte que nos tornamos cada vez mais aquilo que desde o início e para sempre nos decidimos ser: seguidores de Cristo.
A formação do espírito assim entendida é fazer acontecer a essência daquilo que o ser humano é. É o nascimento, crescimento e consumação daquilo que sempre fomos pela graça divina: filhos de Deus. Por Cristo e em Cristo e na identificação com Ele.
Rosângela Barreto é formada em Comunicação e Letras, exerce a função de Executiva de Contas em Recuros Humanos há 24 anos, nas horas vagas adora cozinhar e inventar pratos diferentes