Lino Tavares
Alguém precisa ir a um canal de televisão e dizer aos novelistas que abastecem a “Rede do plim-plim” que a maioria dos telespectadores brasileiros, na falta de coisa melhor, assiste suas telenovelas, mas não é burra, nem idiota, tampouco débil mental, para aceitar com naturalidade certos absurdos que acontecem nessas ‘estórias empasteladas’, que dão especial ênfase àquelas coisas do cotidiano simbolizados em expressões chulas como ‘corno’, ‘viado’, ‘sapatão’ e outras formas de constrangimentos humanos, que a maioria declara, hipocritamente, achar lindo nas famílias dos outros, mas, quando acontece na sua, fica com a sensação de que o mundo desabou sobre sua cabeça.
O autor da recém finda novela “Avenida Brasil” subestimou a inteligência do público telespectador ao tentar fazer crer que seria possível a existência de alguém tão burro, no caso a personagem Nina (ou Rita), a ponto de fotografar uma cena de adultério – certamente com uma câmera digital, já que isso não deve ter sido feito com uma “Polaroid”, nem com uma velha Kodak de negativo – e depois se ver despojado desse flagrante, pelo simples fato de as cópias reveladas terem sido capturadas pelos adúlteros reféns, que com isso se sentiram livres dessas imagens que os incriminava, sem sequer desconfiarem que elas poderiam (e deveriam) permanecer digitalizadas na câmera fotográfica e até mesmo na memória de um computador e/ou como rascunho de e-mail, para serem reveladas quantas vezes fosse necessário, ou enviadas pela Internet aos irmãos ‘chifrudos’ Tufão e Ivana.
Nem é preciso ser completamente adulto para entender que as novelas, tal como as outras formas de produções dramatúrgicas, são calcadas na ficção, estando portando descompromissadas com o que acontece no dia a dia das pessoas. Contudo, é lugar comum dizer-se que a arte imita a vida e, como tal, dela não deve se distanciar de tal sorte que venha a passar de roldão, como um trator, por cima dos mais elementares princípios da lógica e da razão. Encerro com uma pergunta que – pelo menos na minha cabeça – nunca quis calar, ao longo de toda a novela. Por que razão o personagem Nilo, “o lixeiro-mor”, sabendo tudo quanto sabia sobre as sujeiras da dupla de vilões Max e Carminha, nunca quis usar isso para extorquir dinheiro da menina que cresceu no lixo sob suas barbas e se tornou milionária pelo ‘golpe do baú’ que aplicou no infeliz do Tufão ?