Massucatti Neto

                Policiais Militares foram julgados e condenados pela morte de cerca de 50 detentos que foram assassinados em ação de repressão a rebelião ocorrida na então penitenciaria do Carandiru. Depois de vinte anos hoje eles respondem por seus atos, como criminosos comuns, sendo julgados em lei comum.

                Em depoimentos o então governador Fleury disse que a entrada no Carandiru foi necessária, o ex-secretário de segurança Pedro Franco disse simplesmente que falou ao Coronel Ubiratan: “se o senhor precisar entrar para estancar a rebelião o senhor pode entrar”, e reiterando seu depoimento o Sr. Fleury disse que: “acho que não há dúvida que a entrada era necessária”.

                Não quero e nem devo ponderar a decisão judicial, isso cabe a advogados e juízes, acho também que se foram cometidos assassinatos os responsáveis devem ser punidos, porém a operação foi autorizada por autoridades superiores aos policiais que hoje respondem, a começar pelo já morto Coronel Ubiratan (assassinato que até agora não tivemos explicação, além de uma tentativa de se imputar causas passionais a um crime que, no meu leigo modo de ver, tem  características de execução e com toques de ação profissional).

Carandiru

                Mas analisemos a hierarquia e suas respectivas responsabilidades: primeiro o poder no estado é o executivo representado pelo governador, que tem o poder para escolher o secretário de segurança pública, o qual respectivamente indica o delegado geral e o comandante da polícia militar, salvo intervenção federal o governador é o comandante em chefe das forças de segurança pública e responsável pela garantia de tratamento digno e seguro no sistema penitenciário estadual.

                Pergunto: onde estava o governador em um momento de crise tão grave, que não podia ou não queria tomar decisões sobre as ações a serem feitas?  Sendo os detentos, uma vez dentro do sistema carcerário, responsabilidade do estado, e o governador, sendo seu representante maior, responsável pela incolumidade desses, a entrada em uma instituição penal não deveria ser dada por ele, governador, e não delegada ao secretário de segurança, o qual por sua vez delegou a um coronel da PM? Onde estava e o que estava fazendo o então governador Fleury que não pôde ir até o local, ainda pergunto que circunstâncias envolveram o então governador, que estava tão incomunicável a ponto de alegar que não tinha conhecimento da situação real, afinal apesar de serem a mais de vinte anos não era a idade das trevas, haviam métodos de comunicação, o rádio e a televisão em geral não cobriram a matéria de forma completa em tempo real?

                Se a condenação desses Policiais não tem cunho político, então porque o ex governador não está também no banco dos réus, respondendo não apenas por setenta ou cinquenta mortes, mas sim por cento e onze mortes, pois todos naquele presidio eram responsabilidade dele. Que já prevaricava mantendo uma instituição como o famigerado Carandiru, e prevaricou mais em não estar lá quando se fazia necessário.

                Para responder as questões elencadas segue um link da agencia brasil que noticia o depoimento do Sr Fleury: http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-04-16/ex-governador-diz-que-nao-deu-ordem-mas-invasao-do-carandiru-foi-necessaria

                Ou seja, pelo seu depoimento ele responde questões importantes, porém algumas das declarações quero analisar:

            1º “Em Sorocaba, Fleury Filho disse ter recebido um recado dizendo que o secretário Claudio Alvarenga queria falar com ele. “Naquela época não tinha celular”, disse. Liguei para o secretário e ele me falou sobre a rebelião que estava ocorrendo no Carandiru e que o secretário de Segurança Pública da época, Pedro Franco de Campos, estava cuidando do caso.”

 O primeiro celular foi lançado no rio de janeiro em 1990, porém admitindo-se que ele não tinha um celular ainda, na época que ele assumiu seu primeiro ato foi de suprir as policias de equipamentos, inclusive com a compra (que foi alvo de investigação por suspeitas de superfaturamento) de rádios com sistema trunking, coisa de primeiro mundo o mais moderno até então, que funcionava com sistema de repetidoras e com o recurso de comunicação privativa entre as partes.

2º “Em depoimento de 40 minutos, Fleury Filho contou que não estava em São Paulo no dia em que o massacre ocorreu, 2 de outubro de 1992. “Era véspera de eleição municipal e estava em Sorocaba, porque sabíamos que em São Paulo não tinha possibilidade de o meu candidato se eleger prefeito”.

Ou seja como todo bom político estava mais preocupado em colocar os seus no poder do que administrar o estado que o elegeu, e zelar pela segurança de detentos e policiais.

3º “Saí de lá (de Sorocaba) de helicóptero por volta das 16h ou 16h30. Quando cheguei ao Palácio dos Bandeirantes [sede do governo paulista], descobri que tinha ocorrido a invasão. Liguei, então, para o Campos e perguntei se havia necessidade de a polícia ter entrado. Ele me disse que sim” …

Ou seja estava com o pensamento alhures ao que ocorria com a situação, mais preocupado, como já disse, em colocar um dos seus no poder.

4º “O ex-governador disse também que não esteve no local do massacre. “Não fui ao local porque não era minha obrigação de governador. É por isso que existe a posição de hierarquia abaixo do governador” …

“NÃO ERA MINHA OBRIGAÇÃO DE GOVERNADOR”, saliento eu com vergonha. Então quais são as obrigações de um governador? Se uma rebelião, na então maior casa de detenção da américa latina não merecia sua atenção, o que mereceria então?

Omissão assim como a ação também é crime, ele tinha a obrigação além de legal, principalmente a moral de intervir e acompanhar a ação. Mas não! Ele foi omisso delegando decisões a pessoas abaixo dele, pois estava mais preocupado com resultados de eleições municipais. Agora se esse julgamento não tem nem um fio de motivação política ou marqueteira, se esses julgados não estão servindo como boi de piranha para tirar atenção de outros escândalos menos noticiado pela mídia, como por exemplo o caso do metrô paulista que envolve até o “intocável e quase beatificado Mario Covas” (comentarei sobre isso oportunamente), o ex governador Antônio Fleury Filho deveria ser julgado, sentar no banco dos réus e responder pela morte de cento e onze pessoas.

Prevaricou no sentido mais amplo da palavra, seja no âmbito semântico quanto no jurídico, e essa prevaricação colaborou se não incentivou a ocorrência de cento e onze assassinatos, não podendo haver entendimento de crime culposo, pois prevaricação entende um dolo, por haver o agente se preocupado com interesses pessoais em detrimento de agir quando necessário em situação de sua responsabilidade. Portanto para que possamos passar a história desse Estado e desse país a limpo, que não apenas os policiais, que serviram de ferramentas nesse sistema sórdido, mas também e principalmente aquele que por uma clara omissão contribuiu para o fato seja punido.

Se realmente for um julgamento legitimo, onde procura-se a justiça acima de tudo, sem interesses políticos, que o Sr Fleury seja, repito, colocado no banco dos réus e julgado sem privilégios com o rigor que lei exige, pois se assim não for esse julgamento não passará de um teatro e não servirá para apagar essa mancha da nossa história. Pelo contrário, nas gerações futuras será considerado uma farsa, apenas servindo para sujar a história desse tão grande, estado palco das maiores manifestações democráticas e feroz lutador pela constituição, esse estado chamado São Paulo.

2 thoughts on “Carandiru… Está Sendo Feita Justiça Realmente?

  1. Marcos Pereira says:

    Olha Giba, embora a resposta fatídica seja sempre a mesma, mesmo sem necessidade de saber dos fatos, sabemos que o Coronel Ubiratan iria ser pressionado, já que o governador não iria assumir, deixando-o a ver navios, e com isso saberíamos o que realmente aconteceu, sua morte é mais do que conveniente…
    abraços

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