(*) Nelson Valente
O IBGE divulgou relatório sobre a situação da criança, com base em dados de 2006. Há indicadores da tragédia infantil que não devem ser desprezados, como o fato de um terço dos 24 milhões de crianças e jovens entre 10 e 17 anos serem economicamente ativos (trabalham ou já tiveram intenção de trabalhar) e 22% deles viverem em famílias de somente um salário mínimo. Isso pode explicar de modo claro o abandono prematuro da escola.

Aliás, 14% dos 25 milhões de crianças em idade escolar (7 a 14 anos) estão fora da escola. De cada 100 que ingressam na primeira série do ensino fundamental, somente 13 chegam ao final do curso. Há um pequeno aumento no índice de escolaridade, mas o número é ridículo diante das comparações que podem ser feitas com países desenvolvidos.
Não basta ir à escola. Veja-se o número médio de horas/aula: nas nações pós-industrializadas, opera-se com a escola de base 8 x 8 , ou seja, cada aluno fica 8 horas por dia na escola, durante 280 dias, num período de 8 anos. Isto em termos de educação básica. Fazendo as contas, dá uma carga horária, no momento do aprendizado, de algo em torno de 17.920 horas (280×8×8). O número é comparado com o que ocorre no Brasil: são 200 dias letivos para 4 horas diárias (em média) e 8 anos de escolaridade. O total dá 6.400 horas/aula (200×4×8), isto é, quando não há assembleísmo, grevismo,etc.

Por tais números pode-se inferir que nossas crianças recebem 1/3 dos conhecimentos que são ministrados nos países desenvolvidos, o que aprofunda uma diferença hoje abismal. Como seremos uma sociedade competitiva? De que maneira corrigir isso?

O mundo conhece cerca de 30 mil profissões, a quase totalidade proibida a analfabetos ou subalfabetizados, o que hoje corresponde a uma clientela de 44 milhões de brasileiros. Se o analfabeto fala e maneja apenas 2.500/3.000 palavras, como exigir o aumento da sua produtividade?

De toda a forma, a raiz do problema encontra-se na educação básica e nas possibilidades de ensinar adequadamente às nossas crianças, em época oportuna. As distorções idade/série são muito grandes entre nós, fruto de um quase abandono dessa fundamental prioridade. Querem um exemplo? O Brasil tem hoje cerca de 127 mil alunos de pré-escolar com 9 anos de idade e que estão sendo assistidos de modo bastante precário.

Não serão futuros adultos analfabetos? Campanhas e projetos espetaculares não resolvem o problema. Sou partidário de uma ênfase na educação básica, para que se estanque a fonte geradora dessa situação deplorável da educação brasileira.
Pode ser mais uma prova de boas intenções (de que o inferno anda cheio), mas pode ser também o início de um projeto ambicioso e inadiável, que fuja ao lugar-comum das campanhas inócuas e demagógicas.
(*) é professor universitário, jornalista e escritor.

1 thoughts on “Educação:campanhas inócuas e demagógicas

  1. Rose says:

    Giba,o futuro social e político de cada país depende da revolução educacional. E esta só poderá ser ocorrer quando o debate sobre o ensino público tiver seu eixo finalmente deslocado para as questões essenciais: como universalizar a educação básica, para que realmente possa beneficiar os segmentos mais desfavorecidos da população, oferecendo-lhes as condições mínimas de sobrevivência e crescimento social. É importante e vital que haja uma preparação do indivíduo tanto para trabalhar com as novas tecnologias de produção quanto para o exercício da cidadania. Mais investimentos governamentais devem ser carreados para o setor (evitando-se sua corrosão pela inépcia das máquinas administrativas estatais.
    As eleições estão aí, pelo visto estamos ainda nas mesmices e nada será mudado.
    Uma pena!
    abraço

    (Rose)

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