Tem um ‘montão’ de gente contemplada com polpudas indenizações e invejáveis pensões proporcionadas pelo “Brasil generoso” dos dias atuais, sob a alegação de terem sido vítimas de maus tratos e perseguição política no tempo do “Regime Militar”. Outro dia me dei conta de que bem poderia ter reivindicado uma recompensa desse tipo, já que, no limiar daquele Governo, mais precisamente no ano de 1965, passei uma tarde preso na então 6ª Companhia de Polícia do Exército, por razões – que me dou conta agora – eram “de natureza política”.
Vejam o que me aconteceu. Eu servia, como cabo, no Quartel General da 3ª Região Militar, localizado na Rua dos Andradas – popularmente conhecida como Rua da Praia -, em Porto Alegre. Certo dia, fui incumbido de levar um documento a um órgão público, cujo nome não lembro, localizado nas proximidades da Praça da Matriz, , zona central da cidade. Como eu namorava uma moça, residente em um apartamento próximo do local em que iria a serviço, resolvi aproveitar a ocasião para lhe fazer uma visitinha rápida. Mas imaginei que o pai dela acabaria com o namoro, caso me visse por lá fardado, já que era parente e correligionário de Leonel Brizola, um dos desafetos, na época, do regime recém implantado no país.
Por isso, antes de partir para o cumprimento da missão, passei na pensão onde morava, para trocar a farda por um traje civil (Calça Lee, Ban-lon gola olímpica e Bota Calhambeque) , que descaracterizasse minha condição de milico. Apenas em parte, já que o corte de cabelo “cadete”, não raro, levava a desconfiar disso. Naquela época, cabo e soldado só podiam trajar civil com permissão assinada por seu comandante. Entregue o documento e feita a visita, sem problemas, eu me dirigia a passos largos rumo à pensão, para recolocar a farda e voltar para o quartel, quando fui abordado pela patrulha da Polícia do Exército, atraída – é claro – pelo ‘maldito cabelo raspado’. Mostrei a carteira de cabo – o único que eu tinha – em razão da qual me foi solicitada a permissão para trajar civil. Como não a tinha, fui levado para o quartel da Polícia do Exército, onde fiquei detido no xadrez, cerca de quatro horas, até ser conduzido para a minha unidade militar, onde o meu comandante, considerando meus bons antecedentes, me puniu apenas com dois dias de detenção, a serem cumpridos no alojamento das praças e não na cadeia.
De qualquer forma, chego à “brilhante” conclusão – mais de quatro décadas depois – de que essa minha prisão no antigo quartel da Polícia do Exército (depois demolido, cedendo lugar à passagem de um viaduto) cuja foto ilustra essa matéria, aconteceu “por razões de ordem política”, já que, não fosse a necessidade de ter que ocultar a farda para não perder a namorada, devido às divergências políticas entre a família dela e o governo de então, eu jamais teria ido “ver o sol nasceu quadrado” naquela “tropa de elite” do III Exército (hoje Comando Militar do Sul), localizada no local então conhecido como “Praça do Portão”.
Lino Tavares é jornalista diplomado, colunista na mídia gaúcha e catarinense, integrante da equipe de comentaristas do Portal Terceiro Tempo da Rede Bandeirantes de Televisão, além de poeta e compositor
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