Pesquisadores de biotecnologia médica justificam que destino para resíduos biológicos devam ser aproveitados e não encaminhados apenas para laboratório de patologia ou incineração
Você sabia que qualquer material biológico obtido durante uma cirurgia humana pode ajudar a viabilizar pesquisas em prol da saúde? Não é regra ainda no meio médico, mas é cada vez mais usual direcionar tecidos humanos descartados durante procedimentos cirúrgicos para pesquisas baseadas em terapia celular e gênica.
O Dr. Alessandro Zorzi, ortopedista e pesquisador, enfatiza que a maior parte dos médicos cirurgiões desconhecem esses estudos e encaminham os materiais retirados durante cirurgia apenas para laboratório de patologia ou incineração. “Resíduos de procedimentos cirúrgicos ortopédicos podem conduzir a respostas inovadoras – tanto clínicas quanto da ciência básica –, à vários questionamentos de pesquisadores”, ressalta. É importante frisar que o paciente deve, com antecedência, ser informado dos estudos e autorizar o uso dos tecidos e materiais biológicos porventura retirados na cirurgia.
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Ele explica que as áreas de pesquisa são comumente chamadas de experimental life sciences e biotecnologia médica e que os descartes e cirurgias são um material preciosíssimo para os profissionais desse campo de atuação. “As células de cada tipo de tecido são separadas, selecionadas, cultivadas e caracterizadas para que sejam feitas inúmeras pesquisas”, detalha.
No entanto, a exploração dessa ciência não é feita em larga escala no País e nem no mundo. De acordo com Dr. Zorzi, a aumento do número de cirurgias pode justificar a implantação de Bancos de Tecidos e Células.
Dr. Zorzi cita um relatório global publicado pela Research and Market, em 2017, que informa o número de procedimentos cirúrgicos ortopédicos realizados em todo o mundo: aproximadamente 22,3 milhões. O relatório traz ainda que o número de procedimentos por ano deve crescer a uma taxa composta anual de 4,9% no intervalo 2017-2022, aproximando-se de 28,3 milhões até 2022. O que torna esta uma das categorias de procedimento cirúrgico de crescimento mais rápido.
“Para as pesquisas baseadas em terapia celular e gênica, estas estimativas se traduzem em excelentes chances para a implantação de Bancos de Tecidos e Células”, estima.
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Bancos de Tecidos e Células
O ortopedista destaca que a implantação de Bancos de Tecidos e Células é controlada pelo Ministério da Saúde (MS). O Dr. salienta que existem grandes diferenças entre bancos de tecidos e banco de células. Dentro da classificação de banco de células, Biorrepositórios e Biobancos apresentam funções e características distintas.
Tanto a Resolução CNS nº 441/2011, quanto a Portaria nº 2201/2011 do MS definem Biorrepositórios como uma “coleção de material biológico humano, coletado e armazenado ao longo da execução de um projeto de pesquisa específico, conforme regulamento ou normas técnicas, éticas e operacionais pré-definidas, sob responsabilidade institucional e sob gerenciamento do pesquisador, sem fins comerciais”.
Já Biobancos caracterizam-se como “coleção organizada de material biológico humano e informações associadas, coletado e armazenado para fins de pesquisa, conforme regulamento e normas técnicas, éticas e operacionais pré-definidas, sob responsabilidade institucional, sem fins comerciais”.
Sendo assim, explica o médico, toda vez que um projeto de pesquisa é escrito e submetido aos comitês de ética via Plataforma Brasil (sistema eletrônico criado pelo Governo Federal para sistematizar o recebimento dos projetos de pesquisa que envolvam seres humanos nos Comitês de Ética em todo o País), há então o pedido de estabelecimento de um biorrepositório para que seja possível a permissão de armazenamento de material biológico durante a execução do projeto.
“Dependendo do tempo estipulado para execução, todo esse processo de coleta, isolamento, cultivo, experimentação, análise e manutenção dessas amostras – na grande maioria dos casos –, é um processo minucioso, burocrático, trabalhoso e difícil. Nem sempre é possível contemplar todos os objetivos propostos para obtenção de resultados significativos e relevantes”, pondera.
Essa deficiência, de acordo com Dr. Zorzi, invariavelmente acarreta em estudos duvidosos ou incompletos, os quais não produzem uma ciência de qualidade. “Quando há a implantação de um biorrepositório, a coleta de material e padronização são as mais importantes fases da pesquisa. Cada pesquisador ou grupo de pesquisa tem seus protocolos para diferentes tipos de técnicas”.
O Dr. continua: “assim, os Biorrepositórios acabam sendo coleções muito específicas de amostras biológicas de diferentes grupos, que muitas vezes não passam pelo rigor de uma coleção altamente padronizada que segue todos os requisitos globais de boas práticas de manipulação (GMP – good manufacturing practices). Há desta forma, uma tendência global sobre o surgimento de coleções de amostras biológicas padronizadas, que garanta acesso a um material de alta qualidade e reprodutibilidade por parte dos pesquisadores de instituições e centros de pesquisas públicos e privados.
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Na Unicamp
Dr. Zorzi, que entre outras atividades ocupa o cargo de vice coordenador do Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp, afirma que o Banco de Tecidos e Terapia Celular, localizado no Hospital de Clínicas da Unicamp, possui desde 2019 um projeto aprovado para coleta de tecidos musculoesqueléticos humanos. O objetivo é a implantação de um biorrepositório no qual, com o passar do tempo e validações para qualificação, tem a proposta de tornar-se um biobanco de amostras musculoesqueléticas. O acervo servirá também para outros tipos de amostras, abrangendo e beneficiando outras especialidades médicas.
De acordo com o pesquisador, atualmente, a Unicamp já conta com alguns biobancos em pleno funcionamento, como o do CAISM (Centro de Atenção Integral a Saúde da Mulher – Hospital da Mulher Prof. Dr. José Aristodemo Pinotti). Implantado em 2017, o CAISM possui licença para armazenamento de diferentes tipos de amostras e já contribuiu para inúmeras publicações relevantes de alto impacto nas áreas de ginecologia, biologia molecular, zica vírus, oncologia dentre várias outras áreas.
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Dr. Alessandro Rozim Zorzi
Graduado na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP em 1999; fez residência médica em Ortopedia e Traumatologia na Unicamp; especialista em Cirurgia do Joelho e Doenças Inflamatórias no Hospital de Clínicas da Unicamp, onde também fez mestrado e doutorado em Ciências da Cirurgia; fez curso de Especialização em Pesquisa Clínica PPCR Harvard Medical School e em Ética da Pesquisa com Seres Humanos na Unesco.
É supervisor do Programa de Residência Médica em Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp; membro relator do Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp; médico do Corpo Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein em São Paulo, onde atuou como Plantonista em Ortopedia de 2007 a 2020 e como Pesquisador Médico de 2017 a 2020; é professor de Medicina na Faculdade São Leopoldo Mandic em Campinas-SP.
É membro: do Comitê de Medicina Regenerativa da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT); Comitê Musculoesquelético da Federação Mundial de Hemofilia (WFH); Sociedade Brasileira de Cirurgia do Joelho (SBCJ); Sociedad Latinoamericana de Rodilla e Desporto (SLARD), International Society of Arthroscopy, Knee Surgery and Orthopedic Sports Medicine (ISAKOS) e da International Cartilage Regeneration and Joint Preservation Society (ICRS).
Informações à imprensa
Jornalistas Kátia Nunes e Bianca Massafera
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