(*) Nelson Valente
1. CHARLES SANDERS PEIRCE (1839-1914), pensador norte-americano,
instituidor do pragmatismo como método de conhecimento, manteve
relações intelectuais com todos os filósofos importantes de seu
momento histórico – dentre eles: William James, Henry James, John
Dewey, Gottlob Frege, Bertrand Russell.
Não realizou carreira universitária, e seus textos foram publicados
esparsamente, reunidos pós-morte.
2. A posição pragmática (espécie de versão neopositivista mais
avançada) consiste no método para a determinação de significados,
concebidos como produtos factíveis.
O pragmatismo não se propõe, com Peirce, como filosofia. Seu estamento
é de recurso para o pensamento filosófico, instrumento para o
que-fazer filosofante.
3. Algumas constantes na metodologia peirceana.
Sua estrutura de raciocínio e demonstração apóia-se sempre em relações
triádicas. Nisso, deriva direta sugestão da dialética hegeliana (tese,
antítese, síntese).
Todo significado parte de uma hipótese, a que se segue uma operação –
que vai até uma experimentação (ou mesmo um resultado).
O objeto é conhecido e diferenciado pelas consequências práticas que
acarreta e pelos fatos em que resulta.
A concepção de um objeto equivale à concepção de como funciona ou do
que pode realizar. Tal a proposição pragmática, da metodologia de C.
S. Peirce.
4. Três são os elementos lógicos que permitem a decifração dos
fenômenos, ou sua conceituação: PRIMEIRIDADE, SEGUNDIDADE e
TERCEIRIDADE.
Esse sistema triádico identifica as categorias lógicas para C. S. Peirce.
PRIMEIRIDADE é uma qualidade sensitiva, ou sensação percebida (um
orgasmo, um soluço, por exemplo). Resume-se na ideia daquilo que
independe de algo mais. A primeiridade caracteriza os fenômenos
singulares, idiossincráticos, excludentes. Os sentimentos ou as
qualidades puras incluem-se na categoria das primeiridades.
SEGUNDIDADE é reação, resposta. Existindo um duplo termo, nas quais
uma coisa acontece à outra. O nome de uma coisa ou fato é uma relação
de duplo termo. Assim, a percepção sensível que permite conhecer os
eventos ou sua mudança (troca de estado, troca de posição,
referencial) – constitui-se na categoria lógica da segundidade.
TERCEIRIDADE é representação. A ideia que se faz de um terceiro, entre
um segundo e um primeiro; uma ponte entre dois termos ou elementos. A
terceiridade predomina na generalidade, na continuidade que permite,
por exemplo, a elaboração de leis. Toda lei depende de um referencial
(primeiro e segundo), de que ela é o terceiro. O signo, segundo
Peirce, é a ideia mais simples da terceiridade.
5. SIGNO – segundo Charles Sanders Peirce, é aquilo que representa
alguma coisa para alguém, sob determinado prisma. A coisa representada
denomina-a objeto.
O primeiro signo denomina-se REPRESENTAMEN. Cria na mente da pessoa, o
qual é direcionado como emissão, um signo equivalente a si próprio.
A flor que existe no mundo independe de minha vontade. A palavra flor
(ou flower, ou fleur, ou fiore) é um signo gerado pelo primeiro signo
que é a flor.
Esse outro signo, mais desenvolvido que o representamen, denomina-o
Peirce interpretante.
Decorre nova relação triádica – signo / objeto / interpretante, como abaixo:
INTERPRETANTE
SIGNO OBJETO
Entre signo-interpretante e interpretante-objeto, as relações são
causais. Já entre signo e objeto não há relação de pertinência, porque
arbitrária. O signo não pertence ao objeto, o objeto não pertence ao
signo.
Decorre que o interpretante passa a funcionar como a chave da relação
(inexistente) signo e objeto.
As três entidades formam a relação triádica do signo.
Peirce configura a palavra signo numa acepção muito larga e elástica.
Pode ser uma palavra, uma ação, um pensamento ou qualquer coisa que
admita um interpretante, com o qual mantém uma relação de duplo termo.
A partir de um interpretante, e por causa dele, torna-se possível um signo.
Nem interpretante, nem signo, estão contidos na primeiridade ou na
segundidade. Como categoria lógica, ambos incluem-se na terceiridade.
6. Peirce concebe os signos em três divisões amplas: ÍCONE, ÍNDICE e SÍMBOLO.
A partir da exemplificação abaixo, a indução dos conceitos.
Assim: a impressão digital na carteira de identidade (ÍCONE), a
impressão digital do ladrão (ÍNDICE) ou a impressão digital, como
símbolo de campanha a favor da alfabetização (SÍMBOLO).
ÍCONE é um signo que é uma imagem. Caracteriza-se por uma associação
de semelhança, independe do objeto que lhe deu origem, quer se trata
de coisa real ou inexistente.
ÍNDICE é um signo que é um indicador. Relaciona-se efetivamente com o
objeto, por contigüidade. Aquilo que desperta a atenção num objeto,
num fato, é seu índice. Permite, por via de conseqüência, a
contigüidade entre duas experiências ou duas porções de uma mesma
experiência.
SÍMBOLO é o signo que é uma abstração de um concreto. Refere-se ao
objeto que denota em virtude de uma lei, e portanto, é arbitrário e
convencionado. A possível conexão entre significado e significante não
depende da presença (ou ausência) de alguma similitude. Enquanto o
índice define contigüidade, o símbolo, não. Fundamental no signo que é
um símbolo incide em seu caráter definitivamente convencional.
Essa é a divisão triádica dos signos, segundo Peirce.
7. O signo apresenta, ainda três sub-categorias básicas. A partir
dessa nova proposição triádica, C. S. Peirce concebe que todo o signo,
em si próprio, pode ser 1) mera qualidade; 2) existência concreta; ou
3) lei geral.
QUALI-SIGNO é todo signo que é uma qualidade. Como tal,
semanticamente, um determinante. O azul é um determinante (qualidade)
de cor.
SIN-SIGNO é todo o signo que é uma coisa existente, um acontecimento
real. Em princípio, envolve vários quali-signos (ou permite vários
determinantes). O vermelho é soma dos quali-signos de vermelho (que é
uma cor, que é sinal de proibição, que é sinal de alerta, que é sinal
de perigo). O vermelho é o signo de si próprio (sin-signo), somatório
de todos os quali-signos de vermelho). Uma palavra, como tal é seu
sin-signo.
LEGI-SIGNO é o signo que é uma lei. O vermelho como pare, na
codificação visual das leis de trânsito, é um legi-signo. Contudo,
inexiste legi-signo sem sin-signos prévios. O vermelho existe antes
como sin-signo, antes de ser uma lei de trânsito.
8. LUDWIG WITTGENSTEIN (1889-1951), pensador alemão, graduado em
Lógica e Filosofia pela Universidade Britânica de Cambridge, era
também engenheiro pela Universidade de Berlim. Envolveu-se em todos os
procedimentos da lógica matemática e da lógica simbólica (Bertrand
Russel) e sempre se dedicou a pesquisas de lógica semântica.
Seu texto básico é o Tractatus Logico-Philosophicus, publicado em
1921. o livro pretende estabelecer como próprio limite do pensar a
língua.
9. Wittgenstein ponderou o valor de seus conceitos no Tractatus,
numerando-os de acordo com seu peso lógico. Dessa ponderação resultam
sete conceitos básicos no Tractatus:
a) O MUNDO É TUDO QUE OCORRE (1);
b) O QUE OCORRE, O FATO, É O SUBSISTIR DOS ESTADOS DAS COISAS (2);
c) O PENSAMENTO É A FIGURAÇÃO LÓGICA DOS FATOS (3);
d) O PENSAMENTO É A PROPOSIÇÃO SIGNIFICATIVA (4);
e) A PROPOSIÇÃO É UMA FUNÇÃO DE VERDADE DAS PROPOSIÇÕES ELEMENTARES (5);
f) A FORMA GERAL DA FUNÇÃO DE VERDADE É ESTA É A FORMA GERAL DA
PROPOSIÇÃO (6); e
g) O QUE NÃO SE PODE FALAR, DEVE-SE CALAR (7).
Os números indicados à direita dos conceitos acima referidos
correspondem, no Tractatus, ao algarismo ponderado como valor de
verdade.
10. É na proposição (3) que Wittgenstein desenvolve seu tema
relacionado com o signo. Isso ocorre a partir do número ponderado. “Na
proposição, o pensamento se exprime sensível e perceptivelmente”. Para
Wittgenstein, a situação possível nada mais é que o signo sensível e
perceptível.
SIGNOS SIMPLES empregam-se nas proposições, e são chamados nomes. A
função de cada nome é denotar um objeto . Por isso, na proposição, o
nome substitui o objeto.
NOME é um signo primitivo, e portanto não tem denotação. Só em conexão
com a proposição o nome (ou signo primitivo) tem denotação. O nome
denota um objeto, apenas porque o substitui.
SENTIDO PROPOSICIONAL constitui o enunciado mais significativo desse
universo conceitual. Wittgenstein denomina assim, o signo pelo qual se
expressa o pensamento. “O signo proposicional consiste em que seus
elementos, as palavras, estão relacionados uns aos outros de maneira
determinada.” E conclui: “O signo proposicional é um fato”.
11. VERDADE é uma possibilidade que resulta da relação de dois
conceitos: V (para verdadeiro) e F (para falso). As possibilidades da
verdade, em suma, resultam das relações entre esses conceitos. Assim,
tomadas as proposições p, q e r, as hipóteses de relação aduzidas por
Wittgenstein.
12. Para Wittgenstein (como para os pragmáticos) todo signo é
arbitrário, o que deflagra a subseqüência dos elementos arbitrários
que dele derivam. Daí, duas asserções importantes:
A) “Os limites de minha linguagem denotam os limites de meu mundo”. De
que decorre: “Para uma resposta inexprimível é inexprimível a
pergunta”.
B) “O que não se pode falar, deve-se calar”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PEIRCE, Charles Sanders. Estudos Coligidos. Col. Os pensadores, trad.
bras., São
Paulo: abril, 1980 (ant.).
PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica e Filosofia. 2ª ed., trad. bras., São Paulo:
Cultrix / EDUSP, 1975 (ant.).
WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus Logico-Philosophicus. trad. bras., São
Paulo: C.E.N.,
1968 (1921).
VALENTE, Nelson. BROSSO, Rubens. Elementos de Semiótica – comunicação
verbal e alfabeto visual. São Paulo: Panorama, 2001.
(*) é professor universitário, jornalista e escritor
Oi,
Giba,
Gostei muito do post eu que me amarro em signos e todas esas coisas misticas. Muito legal, legal mesmo. Parabéns
bjos
Semiótica!