É lamentável o estado do Ensino Fundamental neste País
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Ademais, os professores não recebem formação adequada para enfrentar os novos desafios de uma educação que se transforma a todo instante por força da heterogeneidade da clientela, não raro sem hadness para a aprendizagem formal; pelas rápidas mudanças tecnológicas; pela impropriedade curricular e pelos descaminhos dos processos didáticos inadequados e, o que é pior, pela desqualificação social e salarial do magistério, submetido à pobreza crescente, tanto do ponto vista econômico quanto do aperfeiçoamento profissional, cada vez mais precário.
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Enquanto isso, o analfabetismo cresce, em vez de decrescer, seja pelos milhões acumulados de seres humanos que nunca pisaram numa sala de aula, seja por outros milhões que deixam a escola sem nada aprender, como é o caso dos analfabetos funcionais, essa nova praga que ameaça comprometer o futuro da nação.
Isso significa que a maioria desses jovens chega ao final do curso sem saber ler e escrever ou fazer as quatro operações aritméticas, o que é tão mais grave quanto se sabe que ler, escrever e calcular são os pré-requisitos básicos da vida cultural e da sobrevivência competitiva dos seres humanos.
Jânio Quadros, na presidência da República, solicitou um Grupo de Trabalho para organizar o sistema educacional brasileiro.
Documento em anexo. Na luta pela criação da Universidade de Brasília Darcy utilizou os contatos políticos e as afinidades regionais para a sustentação de todo o processo de elaboração, construção e funcionamento da referida instituição.
Findo o governo JK e ainda não consumada a construção da universidade, Darcy foi apresentado a Jânio Quadros por Anísio Teixeira a quem Jânio confiara a elaboração do plano de educação do seu governo.
Mais tarde, aproveitou com sucesso o momento da renúncia do presidente para colocar na pauta de votações do Congresso a aprovação do projeto de criação da Universidade de Brasília.
No governo Goulart, Darcy foi Ministro da Educação e Chefe da Casa Civil. Como já assinalado, a parceria entre Anísio e Darcy foi uma comunhão de esforços em busca da legitimação de projetos com o lançamento de estratégias políticas e de uma dose de afinidades regionais exploradas pelos dois atores.
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Nelson Valente – Com tanto conhecimento dos estudantes, o que o senhor está achando do movimento estudantil hoje?
JÂNIO QUADROS:- “O estudante brasileiro hoje não é melhor nem pior do que o estudante que eu fui ou que todos fomos.
As várias gerações a que pertencemos não foram melhores nem piores.
Considero-os menos dotados em termos políticos ou socioeconômicos porque lhes foi vedada a atividade política.
Não sei como a atividade política possa iniciar-se após a conclusão dos cursos. Antes de mais nada a escola deve ser, no mundo em que vivemos, centros sócio-políticos.
A formação política é a formação do cidadão. Se não se permite a atividade política nas escolas como se pode esperar a criação de cidadãos?
É a única restrição que faço à juventude, mas não posso culpá-la disso.
Ela está sendo plasmada assim, com consequências terríveis para o futuro: “com consequências terríveis para o futuro”, (marca as palavras na mesa) Haverá – e já se registra – um vazio de lideranças políticas e socioeconômicas capaz de prejudicar, e muito, nosso processo de desenvolvimento e de independência.”
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Nelson Valente – Mas não estão pensando no futuro. Qualquer pessoa com um pouco de vivência sabe que não se pode cercear o jovem numa hora em que o país está crescendo. Esse medo da atividade política do jovem é uma obsessão pela segurança nacional.
JÂNIO QUADROS:- “Não é apenas o país. O mundo sofreu transformações das quais muitos podem não gostar, mas nem por isso deixam de existir. Este é um mundo diferente, comunitário, de comunicações fáceis, de conscientização de massa.
O estudante me faz lembrar muito o analfabeto, também marginalizado. Por que o analfabeto é marginalizado? Entende-se que não tem consciência cívica, o que não é verdade.
O radinho de pilha, o sindicato, a conversa de esquina, já integraram o analfabeto à vida nacional. Já está conscientizado. Sempre vi o voto do analfabeto com muita simpatia. Para ser franco, receio menos o voto do analfabeto do que o de determinadas camadas urbanizadas que estão mais interessadas em si próprias, no seu status, nas suas vantagens.
O analfabeto, sendo ingênuo em alguma medida, puro embora consciente, é capaz de votar melhor. Certa vez saí de São Paulo e fui ao Chile, presidido por Eduardo Frei, um homem magnífico.
Lá estava um jesuíta holandês chamado Veekmanns que me fez uma observação guardada por mim para sempre. Veekmanns dizia que na América Latina – do México para cá inexiste uma sociedade. Toda sociedade – disse ele – lembra uma pirâmide cuja base se apoia na grande massa.
A seguir vem o corpo médio e depois vem a cumeada, a elite da pirâmide. Essa pirâmide deve caracterizar-se também pela unidade solidariedade e pela permeabilidade, de modo que quem esteja cá embaixo pode ascender e chegar à classe média, quem esteja no corpo médio pode ir à cumeada, e quem esteja na cumeada pode resvalar para o corpo médio ou mesmo para a base.
Ora – diz ele – se alija o analfabeto da sociedade latino-americana, constituindo 1/3 ou 1/2 da população, como pretender edificar uma pirâmide? Como pretender construir um corpo social?
Examinando o argumento não encontrei nenhuma brecha e até hoje parece perfeito. Enquanto não construirmos a nossa pirâmide não teremos nenhuma possibilidade de estado democrático nem possibilidade de justiça social. Esse não é um pensamento esquerdista, mas legitimamente democrático. E cristão.”
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Nelson Valente – Quando o senhor era presidente teve problemas com os estudantes?
JÂNIO QUADROS:- “Tive problemas seríssimos.”
Nelson Valente – Como é que o senhor agiu?
JÂNIO QUADROS:– “Distingo entre a atividade política do estudante e a arruaça do estudante. Não sou a favor da arruaça, da desordem e da irresponsabilidade nos campi.
Recordo-me por exemplo, do caso de Recife onde os estudantes pretendiam que eu destituísse o reitor. O reitor não é eleito por mim, mas pela congregação, quando muito me vem em lista tríplice como em São Paulo. Mandei dizer isso aos estudantes. Responderam-me que entravam em greve.”
Nelson Valente – Mandou dizer através de um emissário?
JÂNIO QUADROS: – “Mandei dizer aos estudantes que entrar em greve era direito legítimo, apenas não contassem comigo para relevar as faltas. Estudante que entra em greve tem que estar disposto a perder as aulas correspondentes ao período de greve.
Se não tiver o número de aulas suficientes que lhe permita prestar exames depois, que pague o preço. E mais: que não se tocasse nos bens da universidade, que não pertenciam aos estudantes, mas ao povo brasileiro.
Promoveram vários quebra-quebras dentro da universidade que eu corrigi com tanques do Exército. Mandei tanques para eles, aí vieram conversar comigo, depois de suspender a greve.”
Nelson Valente – O senhor crê no direito de greve?
JÂNIO QUADROS:- “Ah sim, acho que é sagrado.”
Nelson Valente – esses tanques fizeram o que?
JÂNIO QUADROS:- “Reocuparam a universidade. Custou várias centenas de cruzeiros para reparar os danos causados a bens patrimoniais do povo brasileiro! E numa área paupérrima a do nosso país.”
Nelson Valente – Houve algum estudante ferido?
JÂNIO QUADROS:- “Não me recordo que houvesse. E quando vieram me procurar no Horto Florestal a conversa foi excelente.”
Nelson Valente – Suas reivindicações não lhe pareceram justas?
JÂNIO QUADROS:- “Eu nem sequer havia nomeado aquele reitor, mas o herdara da administração do presidente Juscelino.
Ouvi que esse reitor deixaria a desejar. Nunca comprovei isso, até porque não tive tempo, renunciei alguns dias depois.
Este movimento ocorreu logo antes do período de férias do meio de ano e em 25 de agosto eu ia embora. Mas não sou a favor da irresponsabilidade nem da subversão. Acredito muito em autoridade.
A autoridade emana do povo para ser exercida em nome dele. No momento em que o povo me elege vereador, deputado, prefeito, governador ou presidente.”
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Nelson Valente – Só faltou ser senador…
JÂNIO QUADROS:- “… quer alguém seguro e eficiente, um homem rigoroso que cumpra a lei e a faça cumprir como está escrita. Eu costumava dizer àqueles que não gostavam da lei que não a havia redigido.
Quando Presidente da República desci do Horto Florestal num Volks ao lado de Faria Lima. Eu mesmo estava guiando o Volks e entrei numa contramão. O guarda civil me deteve e me multou. Certo. O Presidente da República não tem imunidades para viajar na contramão.”
Nelson Valente – Ele não te reconheceu?
JÂNIO QUADROS:- “Nem me olhou na direção. Olhou minha carta, escreveu a multa, deteve-se no “Quadros”, deixou cair o livro de multas e o lápis e desapareceu em uma feira livre (risos).”
Nelson Valente – Deve estar correndo até hoje.
JÂNIO QUADROS:- “Juntei tudo e mandei para o Diretor de Trânsito com Cr$ 20 – uma multa de contramão àquela altura – e acrescentei uma observação para que chamasse o guarda e lhe dissesse: “O Presidente da República não tem imunidade para viajar na contramão”. Estou sujeito à lei como qualquer outro.”
Nelson Valente – Voltando aos estudantes: mais uma vez o poder vem negar a capacidade do estudante brasileiro pensar por ele mesmo dizendo que os estudantes são massa de manobra sendo conduzida por subversivos profissionais. O senhor acha que realmente está havendo infiltração entre os estudantes?
JÂNIO QUADROS:- “Não sei. Tenho tido alguns contatos com eles. Anteontem esteve cá uma grande delegação da Faculdade de Economia da Álvares Penteado. Esses rapazes estão querendo montar uma série de palestras e. debates na faculdade, sugerindo nomes da mais alta respeitabilidade.
Desejariam, por exemplo, o ex-Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, Teotônio Vilela, Franco Montoro, Brossard e também me distinguiram com um convite. São moços da classe média, das melhores famílias, de excelente extração. Não registrei dentre eles nenhum comunista, se é isso que deseja saber.
O que registrei neles foi o desejo de saber, de conhecer nossos problemas, e suas eventuais soluções, mesmo conflitantes (os depoentes certamente queriam soluções conflitantes). Mesmo conflitantes essas soluções iriam ajudá-los a encontrar sua própria solução.”
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Nelson Valente – Eu também acho que é isso que está acontecendo.
JÂNIO QUADROS:- “Há quem suponha que, sendo favorável ao divórcio, ao voto do analfabeto, a uma lei severa de Remessa de Lucros, à Reforma Agrária seja eu um homem de esquerda ou tenha eu compromissos com a esquerda.
Não tenho. Sou um democrata que acredita que as democracias modernas não sobrevivem a não ser no atendimento às reivindicações irresistíveis de todas as camadas da população e particularmente das mais sofridas e necessitadas, pois essas reivindicações serão atendidas de uma forma ou de outra.
Acho que foi Abraão Lincoln quem disse: “Se você estiver segurando um elefante pela pata traseira e o bicho quiser soltar-se, o melhor é deixá-lo ir”.
Essas reivindicações têm a força de um elefante. “Eu não vou continuar segurando um elefante pela pata traseira.”
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