Lino Tavares
Arquiteto famoso, mundialmente conhecido, Oscar Niemeyer  recebe com todos os méritos, no ensejo de sua partida, homenagens e manifestações de reconhecimento por tudo quanto realizou no Brasil e no mundo, tendo como obra magnânima os traçados de Brasília, que são um fiel retrato da noção de modernidade que inspirou JK a plantar no Cerrado a semente de um novo Brasil, disposto a se assumir por inteiro no seu gigantismo continental.
Não se pode, contudo, sob pena de juntar-se cinicamente à caravana da hipocrisia, atribuir a Niemeyer, enquanto cidadão comum partícipe da vida em sociedade, as mesmas virtudes que se lhe atribui na condição de formidável gênio da Arquitetura.  Afinal, tratando-se de um comunista assumido, não há como dissociar o ideólogo Oscar Niemeyer das coisas abomináveis ligadas a essa doutrina em nome da qual  afloraram  as mais opressoras ditaduras implantadas a partir do limiar do século vinte.

Tributo ao Gênio sem Deus
Tributo ao Gênio sem Deus

Entre elas, temos ainda bem vivas na memória bestialidade humanas como o Muro de Berlim, os extermínios stalinistas dos campos de concentração da antiga União Soviética, a execução sumária de estudantes que “ousaram” clamar por liberdade na Praça da Paz Celestial, em Pequim, capital da China comunista, e os fuzilamentos em massa no implacável “El Paredón”, de Cuba, por motivos meramente políticos.
Ainda que alguém tente justificar a convicção doutrinária que Niemeyer  sustentou até o último suspiro, dizendo que os tempos são outros e que os países comunistas de hoje são mais democráticos (ou menos ditatoriais) do que os de ontem, terá sua tese prejudicada na simples ausência de eleições livres e  liberdade de expressão, ainda reinantes em países marxistas como Cuba, China e Coreia do Norte.
Nem dizer “que Deus o tenha”, em relação ao grande arquiteto de 104 anos,  que partiu, torna-se expressão de sinceridade nessa hora, pois, mesmo tendo colocado seu gênio criador a serviço da construção de templos majestosos  como a Catedral de Brasília, esse cidadão do Brasil e do mundo não cultivava na alma,  por questão de coerência dialética, aquela fé inabalável que nos faz acreditar na existência do Supremo Arquiteto do Universo.

2 thoughts on “Tributo ao Gênio sem Deus

  1. Jorn. Lino Tavares says:

    Caro leitor Ivani. Tenho certeza de que tudo quanto você diz no seu comentário é expressão da verdade. Eu admiro o arquiteto Oscar Niemeyer e tenho certeza de que ele era um cidadão digno e de bom coração. Mas confesso que não consigo entender qual a razão que leva um homem com tais predicados a optar por essa doutrina que, nos países em que foi implantada, só trouxe sofrimento às sua populações, privando-lhe da liberdade e lhe negando o direito à religião, à livre manifestação de pensamento, e o que é pior, punindo aos que discordam de tais arbítrios, inclusive com o sacrifício da própria vida, como fez a ditadura de Fidel Castro em Cuba. Mal informado o Dr. Niemeyer não era. Logo, a pergunta se torna inevitável. Por que ser solidário a monstros sanguinário como Stalim, Fidel Castro, Mao Tse Tung e seus seguidores ? A missão do comunicador é levantar questões polêmicas que clamam por resposta. É isso o que faço nesse artigo em relação a Niemeyer.

  2. Ivani Medina says:

    Fui maquetista profissional por muitos anos e tive a satisfação de conhecer Oscar Niemeyer pessoalmente. Tenho um colega, Gilberto Antunes, que foi maquetista do ilustre arquiteto por mais de quarenta anos e tornaram-se amigos. Acompanhando o Gilberto, estive por diversas vêzes testemunhando conversas informais com o Dr. Oscar.
    Eu conversava muito com o secretário do escritório, eventualmente com o motorista e já troquei palavras com a cozinheira, que preparava os almoços que o arquiteto compartilhava com os amigos, ali mesmo no escritório. Ouvi muitas histórias pessoais, dessas que nunca serão publicadas. Não por outro motivo, senão a generosidade daquele homem cuja modestia todos respeitavam.
    Para quem o conhecia de perto, o fato de ele ser comunista dava até vontade até de sê-lo também. Emprestava legitimidade a tudo. Abomino ideologias, mas não privo do meu respeito, admiração humana e estima alguns que se compromissaram com elas. O arquiteto Oscar Niemeyer foi um deles. As obras da sua humanidade permanecerão ocultas em respeito a sua memória.

Deixe um comentário

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.