(*) Por: Rosângela Firmino dos Santos
Este artigo tem por finalidade apresentar aspectos analisados no contexto da obra de Nietzsche, “Verdade e Mentira no Sentido Extra-moral” com foco no intelecto, moral, princípio da razão, linguagem, palavras, metáforas, leis da natureza, convenção, ciência, felicidade e sofrimento, ilusão, conceitos, satisfação, desprezo à abstração e insensibilidade ao evento fático.
No dizer sempre expressivo de Nietzsche, o intelecto humano que repousa no berço esplêndido da natureza, é, de fato, o responsável em auxiliar os seres mais desfavorecidos. Essa trilogia, orgulho + conhecimento + percepção, causa no homem um efeito embriagador, que cega e entorpece os sentidos, enganando-os acerca do sentido axiológico da existência. Através do “olhar” de Nietzsche, descobre-se a verdade e mentira no sentido extra-moral. É inegável, de fato, que a ilusão é um efeito mais comum sob esse enfoque.
Interessante se faz notar que o intelecto age por sua vez, como meio de conservar e manter o indivíduo na sociedade. Utiliza ainda, a força da dissimulação, que é uma “semente” que adubada, produz os mais
variados tipos de frutos, inclusive, a ilusão, lisonja, mentira, calúnia, ostentação etc.
O glamour de viver uma vida utópica, ostentando uma realidade irreal, mostrando um status alienado, leva o homem a viver perigosamente, nutrindo a própria vaidade em um eterno prazer frente ao “outro”, em uma constante justificativa inconcebível de afirmação da verdade que é mentira.
Contudo, os homens são acometidos de um instinto de verdade, quase honesto que é possível de acreditar, de tão puro e transparente.
Por exemplo, o indivíduo que recebe um hóspede, mima-o com todas as gentilezas, ofertando o melhor talher, a melhor roupagem de cama e mesa, (usados somente em ocasiões especiais), uma alimentação farta e variada, tudo da melhor qualidade, no rosto um aparente sorriso congelado de alegria. Ademais, com o propósito único de que, o hóspede, ao se despedir, leve uma impressão de que todos os dias do ano são sempre assim.
Por iguais razões, um grande empresário age da mesma forma ao receber um representante em parceria na empresa. Ele usa de toda criatividade, real e irreal, informa inclusive, com sentido aparente de divulgar uma realidade honestamente irreal.
O homem sonha. Mas o seu sonho, enquanto dorme, traz à baila toda sua nudez moral, verdadeira e única.
Traz a verdade, que não pode ser contestada, a princípio, pois é aquilo que é. Diferente disso, o homem não reúne forças que aniquile o seu mais nobre sentido moral, de igual forma, à sua volta, a natureza não dissimula nenhuma das coisas em si, mas torna-o cativo, atrelado a uma consciência enganosa e soberba, alicerçada na rocha, onde o homem debilmente se entrega indouto na sua insensatez, a um mundo vasto, insaciável, mortal, prazeroso e apegado a sonhos. Apegado aos seus sonhos.
Frente ao “outro”, é preocupante inclusive, a manutenção e conservação das aparências. Com efeito, recorre então a recursos facilitadores, e toda sua capacidade intelectual é então desviada para o ato da dissimulação.
Daí por que, para o homem é necessário conviver com os demais, e também ficar sozinho. Viver em sociedade exige alguns princípios de paz, aceitabilidade, beleza, linguagem e neste exato momento, surge esse binômio de oposição, que se contrapõe em um longo duelo: verdade x mentira.
Como se fala a mentira?
Oportuno se faz dizer, que através das palavras, o mentiroso apresenta real o que é irreal, com o único propósito de ser aceito em seu grupo pela sociedade, pois diferente disso, sua aceitação, credibilidade
estará destinada à exclusão. Razão disso é que praticam o livre exercício da mentira, embora prefiram fugir bem pouco da mentira, do que do prejuízo causado por ela.
Mas e se a verdade nos conduzir a resultados destrutivos e perniciosos?
Vale lembrar, que é preponderante o emprego da palavra, expressões faciais, trejeitos, postura corporal etc., recursos esses, utilizados para tornar compreensível a “coisa em si” que é a primeira verdade.
Nesse sentido, vale ressaltar, que no aspecto moral das relações humanas, do homem na sociedade, a obrigação de mentir é adotada convencionalmente fixada para todos, sem exceção, perpetuando-se tácita e passivamente, no esquecimento, até o ponto de admitir que aquela mentira agora, virou verdade.
Inadequado seria esquecer que, para sobreviver dentro deste esquema social, o homem usará sua criatividade intelectual para extinguir as metáforas intuitivas, erradicando de vez a imagem num conceito.
É preciso insistir também no fato de que o homem, pelo seu instinto de verdade e conhecimento puro das coisas, faz uso da intuição, deduz, investiga, procura e descobre a verdade, com domínio, ao que se refere
à razão. Nesse sentido, a ciência concordará sem contradizer.
Portanto, a lei da natureza exige uma análise investigativa, que configure em nós a desconfiança no idealismo focado unicamente no rigor do dogmatismo matemático. Posta, assim, a questão, esta criação artística de metáforas, na elaboração de conceitos, desenvolve primeiro a linguagem e depois a ciência.
Por outro enfoque, o homem tem uma grande tendência para se deixar enganar, como consequência, caem as algemas que aprisionam o intelecto, tornando-se livre da servidão, imita a vida do homem, inclusive, considerando boa, detendo até um sentimento de plena satisfação.
Em última análise, o homem racional adota como real a vida disfarçada pela aparência, beleza, ostentação, prazer. Por conseguinte, o homem intuitivo é sofredor e corre da ilusão para se proteger das adversidades, adotando uma postura inalterável, sem expressão que denotam alegria ou tristeza, nem na mais terrível adversidade, pois ela (a ilusão) busca a proteção contra a infelicidade. E sofre repetidamente, por negar-se a fazer o uso da razão, para subtrair a lição da experiência. E, sem pestanejar, acata passivamente tudo o que lhe sobrevier, sem questionamentos ou mudança de paradigma convencional, sociocultural.
Tradicionalmente perpetuado, conclui-se que a experiência adquirida no fracasso é bem-vinda, é benéfica e vantajosa, segundo a visão teórica e profunda de Nietzsche.
Em suma, quem nunca conheceu o fracasso o que poderá falar sobre o sucesso?
A experiência é um longo caminhar, no qual vivencia na prática, aprendendo e apreendendo conhecimento intelectual, que norteia intuitivamente e racionalmente o homem na sociedade, enquanto grupo e ou sozinho consigo mesmo. Adota o uso da razão, como instância reguladora e imperativa, pois o sentido moral, da verdade e mentira, devido a sua natureza, não colabora com a distorção fática do real.
(*) Este texto foi enviado por nossa amiga Rosangela Barreto (Rose), a quem agradeço a amizade e o carinho de sempre.