Débora Gimenes/ Debby Lenon

Inspirado na musica Venus in Furs, do álbum Velvet Underground & Nico

Paredes roxas. Um colchão velho, nu e encardido jogado no meio do cômodo sujo. Ele, ajoelhado sobre a espuma fedida com os braços acorrentados ao teto deixando seu tronco esticado, está ali há pelo menos duas horas, e eu sentada numa cadeira no canto escuro do quarto.

Paredes roxas. Eu acorrentado sobre um colchão encardido sem um lençol cobrindo sua espuma fedorenta. Minhas costas estão começando a doer. No fim do quarto sei que há alguém, minha carrasca. A senhora que irá me torturar.

Chegou a hora de brincar! Levanto-me da cadeira. Vejo ele erguer a cabeça lentamente, ao fundo a música escolhida a dedo no dia em que ele me contratou. Pobre homem, tanta dor dentro de si. Ali há alguém que precisa se libertar. Seguro o seu cabelo e levanto sua cabeça para que me veja. Não resisto e estralo minha pequena mão naquela bela face.

Uma forma diferente de amar

Ela vem caminhando lentamente, ouço o salto da bota batendo contra o assoalho de madeira. Aos poucos, vejo as botas coladas na batata da perna, cano longo até os joelhos, a coxa grossa, pele lubrificada com um óleo cheirando a amêndoa. Ela está com uma calcinha preta e um espartilho da mesma cor, de renda, deixando os seios aparecerem sob a transparência do tecido. Na cintura, um chicote. Sinto uma dor no couro cabeludo. É ela erguendo minha cabeça. Longos cabelos ruivos presos num rabo de cavalo perfeito. Ela começou a brincadeira, um tapa forte fez a minha pele do rosto queimar.

– Querido, aqui quem manda sou eu! – deixo a cabeça dele cair novamente, seu rosto agora tem a marca da minha mão. Dou a volta e fico por trás, me abaixo deixando meu corpo colado ao seu, ele sente minha excitação, assim como eu sinto a dele. Rasgo sua camisa nova e vejo o suor escorrendo sobre a pele branca. O cheiro de homem que o seu corpo exala me deixa mais excitada.

Eu ouço aquela doce voz me dar ordens, minha cabeça cai bruscamente. Enquanto ela da a volta, posso observar a linda bunda sob uma minúscula tira que desaparecia entre as nádegas. Ela está atrás de mim. Posso sentir sua excitação e sei que ela sente a minha. Sinto que ela rasga minha camisa e o cheiro do seu perfume me enlouquece. Não vai demorar.

Pego meu instrumento de trabalho e começo a brincadeira, as primeiras chicotadas são para esquentar o jogo, as seguintes me dão mais prazer. Cada vez que o chicote encosta na pele desse homem, ele geme não apenas de dor, geme de prazer. Vejo a pele branca mudar de cor rapidamente, rosada, vermelha. Um líquido viscoso e vermelho escuro escorre pelas costas. Chegou a hora de parar. Caminho até ele e, com a mão, toco o líquido quente. O cheiro de ferro me entorpece. Beijo as feridas frescas, meu escravo delira…

Ouço o chicote cortando o ar antes de acertar minhas costas. A primeira de leve, ela está começando a brincar. As seguintes sim, são as que eu pedi, sinto a minha pele inflamar a cada golpe, e o som do seu brinquedo cortando o ar me dá muito prazer. A dor me dá aquilo que eu procuro, é como se eu libertasse meus pecados, minha ira através dessa dor física. Sinto o sangue escorrer pelas minhas costas, ela se aproxima e toca os ferimentos, primeiro com a mão, depois com os lábios, sinto cada vez mais os cabelos da nuca arrepiarem. – Minha senhora…

Ajoelho em sua frente. Na cara de exaustão nasce um sorriso discreto. Olho demoradamente para seu rosto… Percebo que sua barba começa a nascer. Deixo meus lábios tocarem levemente sua face, ele tenta me beijar, mas leva um pequeno choque do meu outro brinquedinho. Ele para imediatamente. Continuo beijando seu rosto, sua boca, seu pescoço. Aprende rápido, fica ali imóvel.

Aquela linda criatura ajoelha-se na minha frente, ganhei meu prêmio, pois isso não estava no contrato. Apesar do cansaço, ainda consigo dar um meio sorriso, aqueles olhos penetrantes me observam, enquanto as mãos macias tocam meu rosto. Um beijo me parece convidativo. Doce engano. Sinto o choque na altura do meu rim esquerdo, ela ainda não cansou de brincar. Deixo que ela continue com sua brincadeira e, enquanto me beija, fico ali, imóvel.

Agora chegou a hora do prêmio. Ele se comportou muito bem, resistiu à dor e às provocações. Começo a me despir, primeiro as botas de couro, depois a calcinha e, por último, o espartilho. Seus olhos brilham. Não esperava aquilo, afinal, não está no contrato. Ajoelhada, arranco o que restou da camisa dele. Aquele corpo seminu é mais belo do que imaginei. Solto seus pulsos e os braços cansados caem; e a exaustão o derruba sobre aquela espuma que a dona insiste em chamar de colchão.

Não entendo o que ela está fazendo. Tira suas botas deixando os pequenos pés de fora, a calcinha minúscula sai sem que eu perceba como. Os seios agora ficam totalmente à mostra, percebo o desenho da renda na pele branca da menina. Ela tira as correntes dos meus braços e o cansaço os deixa pesados demais para que eu possa sustentá-los. Deixo meu corpo cair sobre a espuma sem me importar com a sujeira e o mau cheiro.

Como ele é belo, apesar de bem mais velho, parece um menino. Nada que meus vinte anos pudessem imaginar de um cinquentão, bem diferente dos outros que passaram por aqui nos últimos meses. Deito ao seu lado e acaricio seu peito, deslizo minha mão até o zíper da calça e lentamente abro o jeans surrado. Não sou de fazer hora e arranco a cueca junto com a calça deixando ele completamente nu. – É hora da verdadeira diversão.

Que loucura me envolver com uma jovem de vinte anos, apesar de ser extremamente profissional, sou bem mais velho que ela. Uma relação totalmente diferente das outras que eu vivi. Ela deita ao meu lado e acaricia meu peito com suas mãos delicadas. Garota decidida, abre meu jeans e, sem que eu me mexa, ela arranca a cueca com a calça de uma única vez. Sua voz doce murmura no meu ouvido: – É hora da verdadeira diversão.

Sobre ele, meu corpo começa a balançar e sinto suas mãos segurando meu quadril, era diferente, não estava no contrato e a excitação agora era por causa do prazer e não da dor. Sentir aquele homem dentro de mim era algo mágico, nada comparado aos moleques que eu havia saído por diversão. Não precisávamos ter feito o contrato. Ele se moveu muito rápido e me pegou desarmada, agora eu estava por baixo, com os punhos presos nas mãos do meu carrasco, que me castigava com muito amor e me fazia gemer de prazer. Sua boca beijava minha face, meus lábios, meu pescoço, meus seios… Foram minutos de imenso prazer até chegar ao gozo.

Sobre meu corpo, a pequena garota começa a se movimentar. Seguro os seus quadris com minhas mãos calejadas pela vida. Excitado com o prazer, deixei que ela acreditasse que ainda tinha o controle da situação, parecia que aquilo era um sonho, eu com uma jovem, não se comparava às mulheres com quem eu havia me deitado. Contrato? Sem que ela percebesse, fiquei por cima do seu corpo prendendo seus punhos com as minhas mãos. Penetrando todo meu ser dentro dela, eu queria castigar aquela jovem apenas com meu amor e ouvia seus gemidos de satisfação. Agora eu tocava sua pele com minha boca, deixando seus seios duros como maçãs. Foram minutos de prazer até que chegássemos ao gozo.

Ali passamos a noite toda entre as paredes roxas e sobre um colchão sujo e fedido. Não havíamos feito amor, mas sexo da melhor qualidade. Ele havia me ensinado o que era ser uma mulher de verdade entre quatro paredes e que o prazer não está num motel caro, mas no carinho na hora do sexo. Ajudei com os ferimentos e dei a ele uma nova camisa. Chegou a hora de partir e fui envolvida pelos braços fortes de homem. Um beijo roubado diferente dos outros, esse bem demorado… Foi um erro, agora eu percebia que estava apaixonada.

A noite havia acabado. Curiosamente, meu dinheiro não tinha importância naquele lugar com paredes roxas e um colchão podre. O que eu achava ter sido sexo, tortura e prazer, transformou-se na melhor noite de amor da minha vida, ela ajudou com minhas feridas e me deu uma nova camisa. Envolvi a moça em meus braços e roubei um beijo demorado, eu estava apaixonado.

***

É difícil vê-lo passar pelo corredor e não olhar dentro dos seus olhos. Parece que as noites que passamos na nossa maloca não existiram, foi tudo um sonho. No mínimo, há oito semanas que ele não responde meus e-mails e meus torpedos, nem atende minhas ligações. As aulas terminarão em três dias e então, tudo acabará. Ele caminha em minha direção com um livro na mão. Um leve sorriso em seu rosto.

– Obrigado por ter me emprestado. Uma bela obra.

Sem entender nada, sigo meu caminho. Quando chego na rua, resolvo folhear o livro, dentro dele um CD com a seguinte frase escrita: Nossa magia nunca irá acabar enquanto existir as paredes roxas e o colchão imundo e fedido.

1 thoughts on “Pele da Vênus

  1. Celso Moraes says:

    Interessante a dupla visão dada pelo conto, a do torturado e a da torturadora. Um conto dois-em-um. Gostei da dinâmica da narração, mostrando que os registros concretos de ambos, que obrigatoriamente são iguais, vão dando lugar aos registros interiores (sentimentos).

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